Manifestação de Solidariedade à Retomada Kamakã-Mongoió

Consternado com o falecimento, no dia 04/03/2024, do cacique Merong Kamakã, em circunstâncias ainda não totalmente esclarecidas pelas autoridades competentes, o Gesta/UFMG manifesta sua solidariedade ao povo Kamakã Mongoió e Pataxó Hãhãhãe. Desde outubro de 2021, Merong liderava a retomada do território Kamakã-Mongoió, localizado no Córrego de Areias em Casa Branca, município de Brumadinho-MG, um local considerado sagrado pelos indígenas, e que teve apoio de diversos setores organizados da sociedade civil. Em algumas ocasiões as famílias aí presentes enfrentaram episódios de violência, especialmente voltados às lideranças locais, assim como se defrontaram com obstáculos de acesso a políticas públicas fundamentais, como a educação e saúde. Portanto, o espaço da retomada notabilizou-se pela resistência, persistência e recuperação ambiental da região degradada pelos efeitos da mineração e dos seus desastres, caracterizando uma verdadeira ocupação tradicional.       

Assistimos, surpresos, à decisão da Justiça Federal, que, a pedido da empresa Vale S. A., concedeu tutela inibitória, buscando impedir o sepultamento de Merong Kamakã no território ocupado. É importante mencionar que rituais fúnebres e de passagem compreendem momentos de relevância singular para os povos indígenas e comunidades tradicionais, pois envolvem aspectos espirituais, simbólicos e da própria organização social da vida comunitária. No momento de vulnerabilidade e insegurança, no qual o Estado brasileiro deveria garantir máximo respeito ao sepultamento, aos rituais fúnebres, além de proteção territorial, estimulou-se a continuidade das violências e afetações perpetradas pelo e no contexto do desastre de Brumadinho, causado pela empresa Vale S. A.

Gostaríamos de reforçar o direito dos povos indígenas à diferença, às formas  próprias de organização social e de ocupação territorial, construídas em trajetórias históricas específicas e constitutivas da contemporaneidade da sociedade brasileira, como garantido pelos artigos 231 e 232 da Constituição Federal de 1988; mas também, o direito à espiritualidade e às práticas rituais, assegurado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo governo brasileiro em 2004 e na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, de 2007.

Belo Horizonte, 9 de março de 2024.

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